O que é vida real?

Dessa vez protelei para contar a última consulta ao psquiatra, mas vamos lá.

Desde quando voltei do Brasil para a Alemanha os dias não estão sendo fluidos, atribuo ao clima que nada ajuda. Querido sol como você me faz falta. Essa mistura de saudade, escuridão e desesperança, fez a depressão mostrar suas garras mesmo eu estando medicada.

Só que dessa vez o efeito foi ao contrário, antes eu tinha insônia, agora comecei a dormir demais. Tiveram dias que eu dormi 20h seguidas, não sentia fome, não tomava banho, não escutava as crianças bagunçando, faltei da aula de alemão.

Acordava com a sensação muito boa de não estar vivendo aqui. Depois da segunda vez que isso me aconteceu, liguei o sinal de alerta no máximo.

Primeiro conversei com a psicóloga, foi um debate muito duro porque ela me disse que teria que estabelecer uma tabela com horários de rotina, onde os exercícios e os estudos fossem a prioridade, e que o blog fosse uma atividade esporádica. Que preciso ter mais contato com pessoas na vida real e coisa e tal. Que a movimentação e socialização são os caminhos para abandonar a depressão.

Concordei em partes, na verdade fiquei furiosa e vocês imaginam com qual parte do discurso né. Amo fazer o blog e acho que ele me faz muito bem. Já gastei muito tempo da minha vida com o relógio, a rotina, e à servidão do mundo moderno. Penso que agora posso relaxar e escrever, escrever, até eu virar as próprias linhas… não deu. O *relógio circadiano despertou o alarme e minha vida começou a virar uma confusão.

Então, aí parei e refleti, eu quem estou indo até à psicóloga semanalmente para ela dividir comigo todo seu conhecimento para quê tanta revolta Cristileine?

Ela me perguntou como tinha sido a visita ao Brasil. Disse que foi maravilhosa, mas que ainda assim tinham dias que eu deixava o pessoal conversando e ia dormir. Normalmente acordava às 11h e metade do dia já tinha ido. Que lá tinha gente e falação o dia todo e que estranhava isso.

Aí, ela falou, percebe que você está deixando a depressão entrar pela porta da frente? Assustei, não tinha percebido.

Nessa mesma semana retornei ao psquiatra, expliquei o acontecido. E mais, que engordei dez quilos, ohhh, isso mesmo dez, desde quando comecei o tratamento (final de março do ano passado). Assustei, não tinha percebido, outra vez.

Lembram desse post sobre os efeitos colaterais dos antidepressivos que são engordar e redução da libido? Desses dez quilos, cinco atribuo ao antidepressivo e os outros cinco aos pastéis do Brasil. Delícia! Quanto à libido, than than than thann, só meu marido pode falar, suspense no ar.

Então, na consulta psiquiátrica de repente eu começei a chorar, dizendo que gostaria de ter mais ligação com a vida, mas não consigo encontrar, que tenho todos os motivos possíveis de gratidão e que ainda assim me sinto deslocada aqui na Terra, me sinto culpada por ser assim.

Quando falei isso ele achou que eu acreditava em vidas passadas, risos, deve ser o meu inglês macarrônico. Ele perguntou se eu ouvia vozes, disse que não. Fez uns outros testes de equilíbrio corporal. Perguntou se essa tristeza eu atribuía à depressão ou se sempre fui assim. Respondi a segunda alternativa, aí veio a frase que não sai da minha cabeça:

“Pernonalidade a gente não muda, a gente aprimora”.

“Estou tratando sua doença e os efeitos que ela faz, mas o esforço para elaborar sua personalidade em algo positivo depende de você.”

Pronto, a batata quente está nas minhas mãos.

  • Okay doutor.

– O que tenho para te propor é entrar com outro antidepressivo à base de dopamina que lhe dará mais energia e concentração. Você aceita?

– Claro.

Fui embora do consultório triste porque achava que logo entraria no *desmame e sai com outra prescrição, agora tomo dois antidepressivos.

Pessoal, esse texto já está ficando longo demais, amanhã volto contando as atitudes que tomei, depois desses ocorridos, nesse caminho de encontro ao prazer de viver.

Afinal, vocês sabem me dizer o que é a vida real?


*Relógio Circadiano = processos biológicos que ocorrem regularmente em nosso corpo no período de 24h vigília, sono, concentração, produção de melatonina, cortisol e outros hormônios).

*Desmame = redução da dose de antidepressivo gradativamente até zerar.

 

 

 

17 comentários

  1. Te entendo perfeitamente.
    Eu tenho essas questões em relação à vida também.
    O que minha psicologa sempre me diz é: “Será que a felicidade da vida não está nas pequenas conexões que fazemos? E não em algo ‘maior’?”
    Essa frase do seu médico também me pegou.
    Sobre a questões do ‘real’, rotina, etc… Eu sempre me ‘revoltei’ com isso, gosto de dormir tarde, levantar tarde, dormir à tarde… E meu psiquiatra sempre insistindo que eu deveria manter uma rotina.
    Resolvi parar de ‘teimosia’ e melhorar isso… A primeira conclusão é que tenho me sentido mais disposta e com menos sono durante o dia. Ou seja, meu médico estava certo…
    Ah, sobre a rotina. Aproveite a flexibilidade, mas acho que quem tem depressão e outros transtornos precisa de uma rotina mínima. Não precisa ser algo a ferro e fogo.
    Eu estou exatamente nesse processo. Quer dizer, foi meio interrompido por causa do trabalho que consegui, que inclusive me forçou a ter uma rotina. Haha
    Enfim, acho que felei muito e nem sei se algo fez sentido pra você.
    Por fim, se escrever te faz bem, continue. Mas talvez seja bom olhar e experimentar outras atividades. Talvez isso que sua psicologa queria dizer?
    Enfim, vamos continuar trocando nossas experiências. 🙂
    Bjos Tati

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  2. Olá Cristileine muito bom post acho que varias pessoas infelizmente vào se identificar, a minha Psicóloga diz que eu me vitaminizo, talvez uma forma de me proteger pensar positivo é muito importante mas a depressão não deixa é um esforço enorme. Vai ao meu blog está lá um post para ti titulo Musica e Dedicatória bjs fica bem

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  3. Quem é que sabe definir o que é vida real? Eu jamais ousaria tentar. Todo dia santo e todo santo dia eu me questiono sobre a existência do mundo e perco noites em claro tentando adivinhar para que viermos.
    Antidepressivos são uó… tomei por um período após tentativa de suicídio por causa da doença do século, a depressão. De nada me adiantou. Acho que depressão nunca vai embora, nunca de fato parte, a única coisa que é certeza absoluta nesta vida é que a depressão da gente é como uma sombra muito bem comportada e altamente bem treinada.
    Para não recair as tentações do pós vida, vez ou outra eu coloco a cara no sol e saio para observar a humanidade. Isso me deixa um pouco mais no eixo, me impedindo de desregular meus próprios ponteiros.

    Muito axé pra você!!!

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    1. Maria Vitoria, não canso de falar que é uma honra recebê-la aqui. Sempre leio seu blog e percebo essa sombra altamente bem treinada. Escrever para mim é uma ótima válvula de escape. Ainda estou nessa de ir tentando todas as indicações de tratamento, mas percebo que a luta será longa e árdua. Como somos seres em conflitos tem dias bem resolvidos e outros nem tanto para todos. Em nosso com um toque a mais, a obrigação de vigília para não se entregar ao ostracismo… Nesse seu muito axé vi grau de esperança aí😃 Fico grata, fique em paz🙋🏽‍♀️

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  4. Vou te pedir licença para dar pitacos. Depressão é sim uma situação que nos leva a adoecer, mas dai a relacionar o convívio fora do virtual dando a entender que o mesmo não seria natural ou até uma fuga para o anti social…não concordo. Penso que tudo deva ter um equilíbrio, eu quando percebo estar entrando nesse ciclo mudo o ritmo e direciono minhas atividades a outras coisas, fotografia, andar pela praia, ouvir, tocar e mixar músicas, enfim uma infinidade de coisas que gosto e sei fazer. E se quiser papear no virtual mesmo estamos por aqui. A internet é um local que mesmo tendo lá seus problemas é um espaço que me agrada, afinal s eu não gostar deleto, rsss. 😀

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    1. Olá, dê seus pitacos quando quiser, é bem-vindo. Têm pessoas que estão do nosso lado que às vezes não são tão presentes como as virtuais. Ler sobre as reflexões, poesias, medos e realizações de outros nos torna mais humanos. Dá aquela sensação de estou aqui, também sinto isso…formula pensamentos. Por isso gosto dos blogs, já nas redes sociais (Face, Twitter, etc.) tanto virtuais quanto pessoais eu não sinto tanta atração. Você disse outro fator importante: hobby. “Uma infinidade de coisas que gosto e sei fazer”😃 Obrigada e fique em paz🙋🏽‍♀️

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