Sobre a vida e a morte

A Constituição nos garante o direito à vida, e a maioria de nós se opõe ao direito à morte, vide eutanásia, aborto, suicídio.

Digamos que a vida é tudo o que se apresenta aqui de bom e de ruim. Já a morte é a única certeza da vida. Do resto tudo é fé, especulação e julgamento.

Muitos levantam a bandeira da vida, outros a da morte, entre eles estamos, tudo depende do país onde se nasceu, das experiências que se viveu, dos acesso aos bens e informação, do relacionamento interno e externo que se tem…

É fácil e cômodo dizer que a vida é linda quando tudo está limpo e florido em nosso quintal.

É perturbador enxergar a morte como a única saída da vida… só quem carrega ou carregou essa dor vai entender.

É polêmico e difícil decidir o que vamos fazer “da e com” a nossa vida; imagina com a vida e morte dos outros…

É desafiador “ter e sustentar” sua opinião num mundo de regras prontas, verdades absolutas, num mundo moralista e contraditório.

Mesmo assim, o que mais damos é opinião. Uns para construir, outros para destruir.

Acredito que isso acontece porque quando estamos opinando estamos nos ocupando com nossas próprias angústias, estamos tentando as elaborar e/ou canalizá-las de alguma forma.

É isso aí meus amigos, a vida é morte e a morte é vida porque ninguém morre de verdade sempre deixa os rastros e efeitos de sua passagem.

Figurativamente falando: temos dois braços, dois olhos, duas orelhas e duas pernas para abraçar essa morte/vida.

A autonomia nos dá essa possibilidade, de fazer da vida ou da morte nosso bichinho de pelúcia, e dormir agarradinhos com ele diariamente.

Na vida, são poucos os que não tem essa autonomia de escolha, são muitos os que não sabem o que fazer com ela, são raros os que têm coragem de tomar posse dela e tomar rumo seja na vida ou na morte.

Em todos há algo em comum, o peso da consequência, o peso da existência, pois, nem para nascer e nem para morrer estamos sozinhos, mesmo que passemos uma existência toda sendo sozinhos, precisamos da mão da parteira para nascer e das mãos que carregarão o nosso caixão para nos enterrar.

Filosofia do café

“Tudo é um Todo, tudo em todos, todos em tudo”

O que fazemos e o que deixamos de fazer atinge à todos ao mesmo tempo. O que seria de mim sem muitas doses de café?

Já parou para pensar na cadeia alimentar para o cafezinho chegar à nossa mesa?

Assim é a vida, uma cadeia, e a morte, nos tomando em goladas.

Só por essa consciência, teríamos motivos para fazer dos nossos dias especiais.

Mas, não funciona assim, porque queremos sempre mais, ou não queremos nada, ou não sabemos o que queremos… Será que a vida é o querer?

Os antepassados já disseram que é o pensar, já disseram que é o ser, já disseram que é o doar…

Eis a questão: como desenvolver o saudável querer nesse mundo onde muitos não têm pão para acompanhar o café?

Onde muitos são cobrados e culpados pelo pão que têm? A conquista também tem seu preço através da inveja e da violência.

Onde até podemos aprender a fazer o próprio pão, mas dependemos das condições da terra e do clima para produzir o café. Como? Como desenvolver o saudável querer?

Essas e outras questões nos desestabilizam, evidenciando que nem tudo está na esfera do saber, do “está provado que”.

Mas aqui o assunto não é ciência e nem religião. Aqui o assunto é a vida e a morte. Vivemos no limite das duas, que é uma, uma dualidade.

Muitos não querem morrer, alimentam o sonho de eternidade. Outros estão mortos em vida. O que adianta viver sem prazer?

Pra ser precisa prazer, energia para acordar e querer viver.

Note que aqui a palavra é prazer e não felicidade. Felicidade vai e vêm, é construída e constituída de múltiplos fatores.

Prazer é o sabor do cafezinho diário: no cheiro, nas papilas degustativas, no ritual de preparação, nos acompanhamentos, nas companhias.

Acontece que uns, mesmo gostando muito de café, passam a sentir só o amargor e chega um dia que não sentem nem mais a vontade do café, e chega outro dia que nem lembram que o café existe… e os dias continuam passando. Com a vida toda borrada e a morte degustando.

Tomando escolhas ou não (a tal da omissão) o fato é que temos que lidar com o que temos para hoje. Com seus efeitos e defeitos.

A escolha é a xícara de café que levantamos, o querer é aquele discreto apoio que fica ali quase invisível sustentado o corpo da xícara, esteja ela cheia ou vazia, segurando o derramar de líquidos da xícara, sendo motivo de enfeite nas mãos de uns, e objeto inexistente nas cozinhas de outros.

O querer é o pires de sustentação.

Receitinha para um café maravilhoso:

Quando a água tiver em ponto de ebulição, desligue a chaleira do fogo, coloque o pó na medida certa, deixe descansar, coe num filtro de pano já usado (isso é importante, o passar dos outros pós faz o diferencial para o produto final).

Tome com moderação.

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25 comentários

  1. A felicidade tem que ter motivos que a façam vir, assim como há os motivos que a enxotam. É através da vida que se encontra a felicidade. Quando falo “vida”, não é meramente o fato de estar vivo, andar e sentir, etc. Mas o verdadeiro “viver” significa ter motivos, ter sonhos, ter liberdade e autoestima sempre. Embora os imprevistos venham, mas enquanto houver motivos pra viver, que sejam bem vividos.

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  2. É por isso que expresso poeticamente “morrer hoje é tão bom quanto qualquer dia” que ressoa com a frase que certa vez ouvi: “A vida é um berço que nos prepara para o seio da morte”. É a ideia de entender a perspectiva suicida, e claro, não exclui entender a ideia de valorização da vida: sabemos muito pouco.

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    1. Gostei do seu expresso. Realmente sabemos muito pouco. Para uns o direito à vida, para outros o valor é a morte. Não tem fórmula… há sim muito grito oprimido, sentimentos não entendidos, vida não vívida, pessoas que não experimentaram a valorização da vida por quem devemos lutar com nossas poucas armas que adquirimos na jornada. Abraços Tiel🙋🏽‍♀️

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  3. Cristileine,

    grato pelas visitas à minha página UAÍMA, e, uma vez mais, felicito-a pelo tom de sua página – sem rancores maiores que tantos desvios acarretam e distorcem a percepção do mundo de tanta gente.

    Um abraço.
    Darlan M Cunha

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  4. A morte é um tabu na sociedade, não se consegue dar seu rosto, seu teor, há muita hipocrisia porque realmente a dor de cada um, sua própria agonia, só esta criatura pode saber. Há também uma horda de pessoas que aderem este ou aquele ‘pensamento’ sem parar para pensar com seu próprio cérebro. Eu também critico que a filosofia do positivismo, demoniza os sentimentos que são a tristeza, melancolia, depressão, e não ajuda em nada, porque oprime as pessoas, você não vai encontrar pessoas dispostas ao seu desabafo, só adeptos de churrasco com cerveja, portanto, vendem que a única salvação é o terapeuta, que muitas vezes parece um muro. Sem querer ofender estes, pois tive bons e ruins, mas penso naquela multidão de milhares de oprimidos que não podem ter acesso a terapias nem tratamentos adequados, nem se regojizar com algum churrasco ou uma injeção de morfina ou uma simples aspirina para dor de cabeça… eu sei bem o que é não ter aspirina. Mas, se ouvirmos as pessoas, elas se sentirem acolhidas e abraçadas, ameniza seu sofrimento, o fato de não se sentirem abandonadas no mundo cão. E para as dores de fim de vida, essa é uma escolha das mais difíceis e ainda a opção de escolher morrer, é algo gigantesco, até porque eu sei o quanto isso impacta a vida das pessoas que estão ao redor. Mas, é uma decisão que muitas vezes parece ser o único caminho. Eu perdi um irmão assim, ele com 32 anos, e após décadas, fico pensando o que não fiz por ele, as coisas que teríamos vivido, e tento seguir de cabeça erguida quando a vida murmura laconicamente ‘não’.

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    1. Mara, tão profundo comentário como os textos do seu blog. Concordo que estamos no tempo da felicidade vendida, seja nas fórmulas de farmácia, nos parques de diversão ou nos churrascos. Imagino que o superficialismo e a indiferença têm sustentado esse paradigma. Afastando o homem de lidar com a própria essência, e muito menos com os outros. Toda era tem seus quês, mas faz tempo que estamos só nessa de pão e circo. Tudo isso me assusta, muito mais que a morte. Hoje em tratamento da depressão que chegou a me jogar na cama, consigo ter uma perspectiva mais positiva e buscar a “valorização da vida”. Mas tenho consciência que mais da metade dos depressivos não têm condições e nem consciência de se cuidar. Isso é triste. Quanto à decisão da vida e da morte é um assunto delicado que divide opiniões. Sou favorável a autonomia desde que a pessoa tenha noção do impacto de cada ação. A pessoa vai a dor e a culpa ficam, pois somos a extensão do outro, somos mais importantes do que pensamos. Muito eu já pensei sobre o suicídio, antes que era uma covardia e egoísmo, depois que era uma atitude de coragem e libertação, hoje após a depressão penso que meu julgamento sobre a vida do outro não vale e não muda nada. O que posso fazer é estender a mão, falar das minhas experiências e tentar fazer diferença nesse mundão. Agindo assim me sinto útil e lido com os próprios fantasmas…Sinto muito pelo seu irmão, a gente sempre acha que podia ter feito mais, quando percebe se dá conta que é o dia que nos faz. O dia com suas 24 horas e mil coisas para resolver, quando nos damos conta temos que tomar cuidado porque no meio delas podemos nos perder… Desculpa o comentário gigante, percebi que escrever é um tipo de libertação. Super abraço 🙋🏽‍♀️

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      1. É sempre bom ouvir ou ler e conpartilhar experiências. Também já pensei e nem tão poucas e continuo mas aboli medicamentos, que atualmente minha opinião humilde é que pouco ajuda e traz muitas doenças secundárias com o tempo. Recomendo Atividade física se possível todo dia, atividade ao ar livre, atividades que sejam desafio de aprendizado, trabalhos manuais, meditação e principalmente exercício respiratório voltado a meditação. Eu me debato com a depressão diariamente e falta de perspectiva indo ler escrever desenhar andar. Quando sarar o trauma do tombo na escada quiçá correr e bicicleta. Por hora foco projetos para manter motivada. Concordo que é difícil a cada um e cada dor. Pelo meu irmão ainda resisto. Gravo lembrete de incentivo para ouvir em momentos ruins. beijo no coração e se precisar estou no face Mara Romaro

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        1. Obrigada Mara, sua experiência com certeza abre minha mente. Não quero ficar no antidepressivo pra sempre, mas sinto que agora é necessário. Das suas dicas ainda não aderi à meditação. Mas sei da importância, na agonia nem respiramos. Vou te procurar no face, mas não sou muito adepta a lá. Abraços.

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          1. Obrigada eu, mas a meditação e técnicas respiratórias, exercícios deste tipo são fundamentais, ajudam quanto mais fizer. E ar livro, natureza, contemplação, e tente atividades que nunca fez, fiz uma gama de exercícios mentais, mudando rotina, colhendo o melhor do dia em um frase, novos pratos culinários, tudo que pude e me reprimia, andar em ruas que não ia, visitar pessoas que não visitava, tudo sem gastar um centavo. Mesmo assim, a depre é ferrenha, então estou sempre vigiando, repensando, replanejando, me refazendo e tentando aguentar firme os momentos negros, com figuras coloridas inspiradoras, poesia dos outros também , livros, enfrentando com disciplina cada trauma e problema que ficou dos remédios, é uma luta diária. Tem que se vigiar e domar, para sempre. Até reforma, arrumações, pintar parede de branco, até isso ajudou. Ambiente que façam sentir leveza. Arrumar armário. E sair da cama.

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          2. Tudo isso lhe custou muito empenho, e colheu redescoberta. O tal do querer que mencionei no texto. Sei que só estou começando andar, bem pior quando eu não sabia e nem assumia o que tinha. Agora é vigia e luta. Vou tentar me empenhar na meditação, já consegui alguns progressos noutras áreas, sei que falta o respirar. Você nem imagina como seu depoimento me abriu horizontes. Obrigada.

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  5. Tomar ou ser tomado, ativo, passivo, presente ou passado, tudo é apenas uma questão de referencial. Tudo ou nada, onde começa o fim, onde termina o início? ….

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