
Esse foi o primeiro ano novo, desde que tenho consciência, que eu passei literalmente sozinha, calma, não há drama nenhum nisso, muito pelo contrário. Preparei minha ceia como de costume, enfeitei a mesa com flores, vi a queima de fogos na sacada, o que foi um espetáculo à parte e merece até outro post. E lá fui eu, para o início do que tinha preparado para a noitada, comecei a montar o quebra-cabeça de mil peças da pintura de Paul Gauguin, La Orana Maria.
Primeiro quero contar o porquê da escolha dessa pintura, são raros os pintores que retratavam pessoas que não fossem brancas em seus quadros. Quando me deparei com uma obra de Gauguin fiquei fascinada (leia mais em A Cor do Quadro Eterno), era a pintura do nascimento de Cristo, onde os personagens têm características taitianas.
Agora quero contar tudo o que aprendi com o quebra-cabeça.
Escolhi esse jogo porque exige concentração, persistência, estratégia e paciência. Também por ser um dos meus favoritos na infância. Comecei pelas beiradas, acho que esse é um truque que a maioria das pessoas fazem. Me dei mal porque separei muito mais peças do que realmente as que eram da beirada.
Lição aprendida: nem tudo é beira, é preciso mergulhar no fundo.
Lá fui eu, as peças eram pequenas e as cores se misturavam. Aquilo tudo me instigava. Quando o primeiro rosto me apareceu, sorri para ele e segui meu trabalho. Claro que não terminei na passagem de ano, foram noites e dias e muita teimosia.
Lição aprendida: nem tudo é no tempo que imaginamos.
Contudo, quando se vê a beleza tomando forma, sendo construída por suas próprias mãos. Epa! Retificação: sendo construída por várias mãos. Enquanto eu encaixava as peças, fiquei imaginando em quem as desenhou, como foram cortadas milimetricamente, revisadas, empacotadas, transportadas, até chegar na mesa do Réveillon.
Lição aprendida: tudo na vida é interligação!
Segui, percebi que até no quebra-cabeça a gente mete os pés pelas mãos, neste caso, pelas cabeças. Explico: as peças dos dedos dos pés das fiéis e a região da orelha do menino Jesus tinham a mesma tonalidade.
Lição aprendida: os encaixes estão aonde você menos espera.
Chega uma hora que as cores e formas vão se tornando uma em sua visão. Fica tudo embaralhado, dentro e fora da gente. Aí você lembra que precisa levantar, beber água, ir ao banheiro, como diz o dito popular “espairecer a cabeça”.
Lição aprendida: Toda quebra pede um refresco.
Quando você vê está pronto um pouco do arbusto aqui, outras flores ali, um vestido acolá … e você vai que vai juntando as peças no labirinto. Há também o murmúrio: é impossível, isso aqui só pode estar faltando peças. Quando vai ver, as peças sempre estiveram lá, embaixo dos seus olhos.
Lembra daquela história de quando criança e você se machucava aí lhe diziam: fica tranquila quando casar sara. Pois é, então, eu pensava quando chegar o outro Réveillon eu completo esse quebra-cabeça. Mas, terminei antes mesmo desse janeiro chegar ao fim.
Lição aprendida: o infinito está no momento. Certo ou errado, com dor ou com amor, tudo se completa no quadro da vida.
Enfim as peças vão se encaixando, você olha a obra de cima, de outro plano, você já não está mais ali envolvida tentando fazer o encontro das peças. Você é o observador. Tudo vai criando sintonia. Daí você percebe a força da intuição. A vida é intuitiva!
Pedi a benção à mãe Maria. Lembrei de quando fui carregada no colo, de quando carreguei seres no meu ventre. Lembrei que hoje há mais seguidores do que fiéis; há mais repetidores do que autores; há mais ferozes do que verazes. Lembrei que a vida é um quebra-cabeças.
Lição aprendida: há muitas perspectivas, ainda assim, todas se conectam na mesma pintura.
E você, gosta de quebra???


Maravilhoso, Cris. Em especial: o infinito é no momento. Muito obrigado.🌷🌷🌷
CurtirCurtido por 1 pessoa
Agradeço também por sua manifestação 🌷🌷🌷
Abraços infinitos 🙋🏽♀️
CurtirCurtir
Já passei alguns, nos meus quase 70 anos. Estar bem é estar. Gosto muito de ler o que escreve. E leio tudo, em todas as redes. Abração.
CurtirCurtido por 1 pessoa
Oi Odonir,
lembrei do poema “Eu sei mais não devia” da Marina Colasanti ao ler seu comentário. Vai entender as conexões do cérebro.
Para mim é uma honra suas mensagens e leituras, pois, sou admiradora de sua escrita e postura. Agradeço por sua presença.
Volto a dizer que em breve a Cristileine leitora voltará, por enquanto estou recolhendo as peças… logo estarei inteira.
Forte abraço também 🌼
CurtirCurtido por 1 pessoa
Conheço o texto. Inclusive o Grupo de Teatro Ponto de Partida, daqui da cidade, já o encenou. Abraço parceiro, viu.
CurtirCurtir